O professor da esperança

Neste momento de profundo pesar e reconhecimento, prestamos uma singela, mas sincera homenagem à memória de Sérgio Manucci, professor, educador, sindicalista, ex-vereador e figura histórica da vida pública e educacional de Poços de Caldas.
Sérgio iniciou sua trajetória pública ainda na juventude, como líder estudantil no Grêmio Afonso Celso, do Colégio Marista.
Atuou ativamente na Juventude Estudantil Católica (JEC) e na União Municipal dos Estudantes (UME), organizações nas quais se engajou na luta pela ampliação do ensino fundamental gratuito - que, à época, contemplava apenas as quatro primeiras séries.
Durante os anos mais duros da ditadura militar, Sérgio se destacou como uma voz firme e corajosa contra o autoritarismo.
Com ideias progressistas e espírito combativo, participava da produção de panfletos críticos ao regime, impressos em um velho mimeógrafo a álcool - símbolo daquela resistência silenciosa que alimentava a esperança de dias melhores.
Mais tarde, já com um mimeógrafo a tinta, continuou distribuindo seus textos, contribuindo para a formação de uma consciência democrática em tempos de censura e medo.
Ao concluir o ensino médio, ingressou na antiga FAFI/Poços, onde se tornou rapidamente um líder universitário respeitado.
Com inteligência, sensatez e firmeza, consolidou-se como uma liderança regional. Formado em Matemática, exerceu o magistério com paixão e excelência, tornando-se um professor admirado por seus alunos, requisitado por escolas particulares e instituições de ensino superior, inclusive em Águas da Prata.
Sérgio nunca se afastou de suas raízes. Orgulhoso de sua herança ítalo-brasileira e de seu compromisso com a justiça social, ajudou a fundar o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE) e liderou a histórica greve dos professores da rede estadual em 1979 - gesto que o projetou como uma das principais lideranças de esquerda em uma cidade tradicionalmente conservadora como Poços de Caldas.
Em 1982, ingressou no PMDB, integrando o grupo que ficou conhecido como os “Meninos do PMDB”. Candidatou-se ao Legislativo e foi eleito vereador com expressiva votação, num cenário em que havia apenas cerca de 15 mil eleitores.
Em 1983, com a nomeação de José Aurélio para a Prefeitura, Sérgio assumiu a Secretaria Municipal de Educação, onde promoveu uma gestão democrática e inovadora, marcada pela eleição de diretores, fortalecimento dos grêmios estudantis e implantação dos conselhos escolares.
Ao lado de Santa Chaves, foi uma das figuras centrais na conquista do ensino médio gratuito na rede estadual.
Fundador do Jornal da Mantiqueira e sócio da Gráfica Brasília, Manucci foi também um articulador cultural e comunicador inquieto.
Mas, acima de qualquer título ou cargo, foi um professor de vocação, um amigo leal e uma pessoa de simplicidade e generosidade ímpares.
Gostava das festas, das conversas cheias de histórias e das canções de Chico Buarque e Gonzaguinha, que tantas vezes embalaram os encontros entre companheiros de luta.
Neste fim de semana, Sérgio Manucci nos deixou. Mas partiu levando consigo o carinho de milhares de ex-alunos, a admiração de seus colegas, e um pedaço do coração de seus muitos amigos - entre eles, aqueles que ainda guardam na memória o som do velho mimeógrafo funcionando madrugada adentro, produzindo palavras de coragem para um povo que aprendia a sonhar com liberdade.
Saúde, Serjão. Que sua luta continue nos livros, nos panfletos, nas salas de aula e nos sorrisos de quem aprendeu contigo a importância da dignidade, da educação e da esperança.
* Rovilson Molina Lopes é professor e ex-secretário municipal de Educação de Poços de Caldas
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