Terras raras: socioambientalismo e geopolítica
Quis a natureza grávida por milhões de anos de pressão, calor e impaciência tectônica que o Planalto de Poços de Caldas brotasse violento tão violento como violenta a clausura do útero que o continha, com perdão da pobre referência às letras iluminadas de Bertold Brecht.
Quis o destino que o Planalto, caldeira vulcânica de setecentos e setenta quilômetros quadrados, voltasse após sessenta anos, à mesa de decisões geopolíticas do Brasil - na primeira, pelo urânio, na segunda por essa extraordinária insurgência que se refere ao potencial econômico e estratégico das reservas de terras raras identificadas em seu berço.
Com uma diferença abissal - na primeira, tempos cinzentos e autoritários sem nenhuma participação social. Na segunda, agora, com uma sociedade mais atenta e organizada e tempos de democracia.
A tragédia ambiental da primeira não precisa nem poderá ser repetida na segunda. Toda política sobre as terras raras terá que levar em conta que as questões sociais e ambientais compõem um todo, inseparáveis como humanidade e natureza, porque “tudo está relacionado entre si; tudo que fere a terra fere também os filhos da terra”, na afirmação do grande chefe Seattle, popularizada nos anos 1970 na excitante e aterradora obra de Dee Brown - “Enterrem meu coração na curva do rio”.
Sua formulação, necessariamente, deverá levar em conta o papel dos movimentos sócio-ambientais, considerando paradigmas indispensáveis de sustentabilidade, como o desfrute das riquezas da terra hoje, sem comprometer a mesma chance às gerações futuras.
Por falar em sustentabilidade, é indispensável falar sobre a importância das chamadas “terras raras” na transição energética, na substituição dos combustíveis fósseis e, portanto, nas ações urgentes contra o aquecimento global.
Esses minerais não são raros pela sua ocorrência na natureza, mas pela dificuldade de exploração, sobretudo por sua ocorrência nas rochas.
No caso do planalto, esta-mos tratando de ocorrências em argila iônica, rochas “apodrecidas”, carreadas e depositadas no leito da bacia, falamos de reservas muito grandes de extração fácil e menos impactante quando comparada com depósitos em rocha. Menos impactante não significa sem impacto.
Por sua importância na transição energética - e não apenas - é preciso entender que a exploração de ETRs é inevitável. Inevitável porque coloca o Brasil em outro patamar de desenvolvimento e importância geo-política no mundo. Esse dado da realidade exige um debate aberto, transparente e, sobretudo, sem açodamento.
A correria que se observa e se traduz no assédio aos órgãos ambientais e parcelas da sociedade, precisa ser evitada.
Licenciamen-tos a qualquer custo, apoios incondicionais e acríticos tendem a comprometer a credibilidade quanto aos objetivos das empresas envolvidas.
À rigor, cabe ao governo federal estabelecer o modelo de exploração de terras raras, levando em conta os interesses e a soberania do Brasil, os direitos minerários, o capital nacional, a saúde do trabalhador e, sobretudo, o respeito indivisível à natureza e sociedade, para que não e repita como tragédia a farsa e a farra da extração irresponsável do urânio no Planalto de Poços de Caldas.
* Paulo Tadeu é médico veterinário, ex prefeito e ex-presidente da Câmara Municipal de Poços de Caldas. Atua no MASA Mantiqueira
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