Nova releitura apresenta Cinderella empoderada

Entrou em cartaz neste mês na Amazon Prime Video uma releitura de Cinderella, um dos maiores clássicos dos contos de fada.

A produção em live-action propõe uma nova e ousada releitura da história infantil, promovendo algumas alterações que não mexem muito com a trama, mas mudam o comportamento dos personagens.

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Todo o empoderamento e a igualdade de gêneros propostos neste novo filme são bastante relevantes e estão na ordem do dia, mas para uma trama que se passa na Idade Média, onde a sociedade vivia sob os conceitos que agora são combatidos, parece soar fora de contexto.

Ao contrário de versões anteriores, a nova produção trata-se de um musical declarado e não apenas uma aventura convencional inspirada no conto de fada. Isso se deve principalmente pelo fato da cantora cubana Camila Cabello ter sido escalada para interpretar Ella, a protagonista.

O apelido de Cinderella, pouco usado nesta produção, foi dado pelas irmãs postiças, que já não são mais tão malvadas como outrora, pelo fato dela ficar coberta de cinzas ao se esquentar perto do fogo da lareira.

Voltando ao enfoque musical, a produção busca explorar o talento musical de Camila Cabello como cantora. No decorrer do filme, chega-se a ter a sensação de que ela tem não tem envergadura para viver uma princesa do porte de Cinderella, mas o fato mesmo é que Camila tem carisma, consegue impor sua presença e não decepciona cantando sucessos do pop internacional atual e ainda outras músicas autorais criadas para a produção.

A pegada musical, abusando de hits pop, praticamente é a mesma proposta já vista em Moulin Rouge – Amor em Vermelho (2001), quando Nicole Kidman e Ewan McGregor fizeram vários duetos ao longo da produção.

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Na prática, a estrutura básica do clássico foi mantida, mas com algumas pequenas alterações. Ella é uma órfã que vive com a madrasta e com as irmãs postiças, fazendo o papel de serviçal. Se antes ela morava no sótão e falava com passarinhos, agora ela mora no porão e conversa com ratos.

O interesse amoroso pelo príncipe (Nicholas Galitzine) também está mantido, mas Cinderella tem outros sonhos, entre eles, se tornar uma costureira reconhecida pelo seu talento. Sem dúvida, é a grande novidade do filme, ao apresentar uma Cinderella empoderada, que não hesita escolher entre uma carreira profissional independente e uma vida luxuosa submissa dentro do palácio real.

A fada madrinha, historicamente sempre caracterizada por uma afável mulher de meia idade, agora é interpretada por um travesti negro (Billy Porter), que aposta mais no deboche do que na simpatia, o que não chega a comprometer a interpretação e até dá um toque de humor e mais leveza à trama.

O empoderamento não fica apenas com Cinderella. A rainha Beatrice (Minnie Driver) e a princesa Gwen (Tallullah Greive) também não aceitam passivamente seus papéis secundários dentro do organograma real e se rebelam contra o machismo do rei Rowan (Pierce Brosman).

O grande problema do filme foi a humanização exagerada da madrasta (Idina Menzel) e das filhas (Maddie Baillio e Charlotte Spencer). Elas continuam interesseiras e mantêm uma certa dose de má vontade com Cinderella, mas em momento algum conseguem criar algum tipo de antagonismo, o que sempre foi um dos alicerces do conto de fadas.

Com isso, o clímax da história, que é o momento de triunfo de Cinderella quando se descobre que ela é a verdadeira escolhida do príncipe, se esvazia totalmente.

Sem esse antagonismo, resta à trama apenas a expectativa em saber se Cinderella vai optar pela carreira profissional ou pela vida palaciana, um dilema que é importante, mas que não empolga.

* João Gabriel Pinheiro Chagas é jornalista e diretor do Jornal da Cidade. E-mail: joaogabrielpcf@gmail.com