Star Wars VII vence pela nostalgia

A história não é exatamente outra: segue a linha convencional da trilogia clássica

Avaliação do Editor

9.0
Pontos 9.0

O crítico de cinema Marcelo Leme comenta o mais novo episódio da franquia Star Wars. Em O Despertar da Força, a estética e a harmonia continuam a mesma dos outros filmes.

Star Wars: Episódio VII – O Despertar da Força vence pela nostalgia. É um tiro certo aproveitá-la na produção. E como não? Há uma legião de fãs que aguardaram para rever o retorno desse universo nas telonas e vivenciar a sensação de reencontro. Rever todos os personagens que de alguma maneira fizeram – e fazem! – parte do imaginário popular é algo sempre muito satisfatório. Dessa forma, poder acompanhar alguns dos personagens que fizeram parte da trilogia clássica é um deleite. Até mesmo se o filme fosse ruim, suspeito, tal ação faria igual sucesso. Felizmente para a significância da obra, por sua relevância e principalmente pelo cinema, esse novo capítulo é um belíssimo filme que consegue brilhantemente um equilíbrio complexo: balancear a nostalgia e a novidade.

A princípio, notamos que a estética e harmonia é basicamente a mesma. A marca de George Lucas está ali. A história não é exatamente outra. Segue a linha convencional da trilogia clássica e exprime um novo esboço de oposição envolvendo funções paternais. Isso nada mais é do que um arco dramático que dialoga com todos os 6 filmes anteriores. Nesse aspecto, a revisitação a um tema vigente da franquia cai muitíssimo bem. Já a novidade factual vem em outra frente. Tratarei sobre ela ao longo desse texto.

Uma nova ameaça aterroriza. Similar ao que ocorrera em O Império Contra-Ataca, décadas após a queda do Império, surge uma tal Primeira Ordem, jurando concluir o que o Império fracassou em fazer. Com ela aparecem novos personagens, novos contextos, resquícios do passado em cena – seja no visual com marcas dos conflitos passados bem arranjados em sua arte conceitual ou nos diálogos informativos. Novos personagens despontam.

Kylo Ren é o novo vilão da franquia
Kylo Ren é o novo vilão da franquia

Bons atores se envolvem, como Oscar Isaac, ator que vive em franca ascensão, dá vida ao piloto Poe Dameron. O talentoso Adam Driver, notado em Frances Ha e que trabalhou com Oscar Isaac em Inside Llewyn Davis, tem a difícil missão de soar tão ameaçador e promissor quanto Darth Vader. Adam vive Kylo Ren. Tem até uma trilha exclusiva dedicada a ele. O desconhecido John Boyega interpreta Finn, talvez o personagem mais aborrecido até aqui. Está entregue as gags e alívios cômicos. Equivale-se ao Jar Jar nessa sequência. E o destaque fica por conta de Daisy Ridley, uma das grandes revelações dos últimos anos em Hollywood. E tem o dróide BB-8, adorável!

Tanta gente nova vem fazer companhia a Harrison Ford, Carrie Fisher e Mark Hamill. Ambos seguem monumentais! Além deles, claro, aparecem tantos outros personagens imortais. A condensação dos diferentes universos foi feita por J.J. Abrams, o mesmo cara que ressuscitou a franquia Star Trek. Ele está plenamente afinado ao universo, criando grandes imagens e coordenando poderosíssimas cenas de ação. O roteiro é eficiente, ainda que pareça assombrado pelo idealismo de Uma Nova Esperança. Às vezes não soa tão original, mas como uma releitura cujas referências dilatam-se. Se o filme fosse feito exclusivamente aos fãs, tantas referências faria muito sentido.

Além de tudo, ainda nesse assunto de finalidade a determinado público, me interessa muito o respeito da franquia com seus fieis fãs. Isso é bonito. Bonito na telona e bonito fora dela. Imagino o quanto tudo isso significa àqueles que se vestem como seus personagens, que se inspiram por cada um, que discutem filosofia, política e qualquer outro assunto baseado na reflexão que a história alguma vez propôs. Em outras mãos, talvez, o apego a tal respeito poderia arruinar a franquia, trazendo uma história desnecessária a fim de, unicamente e exclusivamente, lucrar com tal título. Nesse sentido, toda a trama envolvida em O Despertar da Força dá respaldo a percepção de originalidade temática em conjunção a nostalgia inevitavelmente vivenciada. É aí que entra o detalhe do sucesso: o mencionado equilíbrio entre o velho e o novo. O velho amado e o novo idealizado.

A idealização parte da dúvida e do temor. Era mesmo necessário fazer uma XII parte? Muitos provavelmente questionaram. Não era necessário. Ela foi feita sem necessidade alguma. Uma vez realizada, ganhou finalmente alguma necessidade, a de ser desenvolvida, desenrolada e finalmente concluída, pois fora expandida. É impossível afirmar se o que virá adiante fará bem ou mal ao universo de Star Wars. No entanto, diante esse feliz capítulo, parece-me que seus fãs e demais interessados poderão aguardar o futuro com bastante empolgação, tendo a certeza que a história está em ótimas mãos.

E mais…

E se tratando de uma sequência quase que independente da história anterior, vê-se que há algumas novidades pontuais que muito acrescentam a história. E como não desejo trazer spoilers, me absterei de discuti-las com detalhes, exceto uma, aquela que considero ser a grande surpresa e força nesse episódio XII, ao menos aquela que oferta um universo de demandas especiais: a protagonização de Rey (Daisy Ridley). Ousaria dizer que entre todos os 7 filmes, é Daisy Ridley quem oferece grandes momentos dramáticos com essa sua notável personagem.

Rey tem atribuições que vão além do maniqueísmo prático, e tem grande potencial de crescimento. A personagem é ótima. A atriz é ótima. Ela soma-se a Furiosa de Charlize Theron em Mad Max – Estrada da Fúria e a Ilsa Faust de Rebecca Ferguson em Missão: Impossível – Nação Secreta como notáveis protagonizações femininas em filmes outrora dominados por personagens masculinos. Tudo isso em 2015.

Dentro desse viés revolucionário de gênero, bons frutos estão sendo colhidos. Protagonistas nos desertos, nas cidades, nas estradas e nas estrelas.

* Marcelo Leme é crítico de cinema e psicólogo