Salário de vereadores: entre o direito e o dever

O jornalista Wiliam de Oliveira tece seus comentários sobre o reajuste

O jornalista Wiliam de Oliveira tece seus comentários sobre o reajuste do salário dos agentes políticos municipais (prefeito, vice, secretários e vereadores).

Sou daqueles que defendem que todas as pessoas deveriam ganhar um bom salário, principalmente eu mesmo. Não sejamos hipócritas: todos achamos que merecemos ganhar bem e se pudéssemos aumentaríamos mensalmente os nossos próprios salários. Nesta linha, advogo que o vereador, como agente político, deve sim receber salário, ao contrário de anos atrás, quando o edil trabalhava apenas “pelo bem estar da população”.

Noto ainda que geralmente não aceitamos o vencimento de um vereador por 3 motivos básicos. Primeiro, porque eles (os agentes) percebem (ganham) muito mais que a gente. Segundo: não percebemos (sabemos) muito bem o que eles fazem para ganhar tão bem e terceiro: enquanto eles ganham sempre mais (independente da crise), temos a percepção que estamos perdendo sempre a cada instabilidade econômica no país.

Por tudo, com o novo aumento dos salários dos vereadores em Poços de Caldas, (10,67%), aprovado por unanimidade em reunião na Câmara, o tema voltou a ser objeto de discussão e as perguntas e respostas seguindo a mesmice de sempre. Pergunta: Por que houve o aumento do salário do vereador em Poços (agora, R$ 11.337,24)? Resposta: O aumento é um direito legal do vereador e de outros agentes, lembrando que os salários do prefeito, vice e secretários também foram aumentados.

Sabe-se que os vereadores, por lei, podem receber de 20% a 75% dos salários dos deputados estaduais, dependendo do estado no qual o município está situado, a população da cidade e o que aquela despesa representará no orçamento. Sem querer aprofundar por demais nestas questões legais, discutir o salário de um vereador, entre outras coisas, é perceber a diferença entre o direito e o dever.

Se o vereador tem o direito legal ao aumento, também é importante lembrar que ele (assim como todos os outros agentes na escala hierárquica) deveria ter o dever de olhar para a situação e o contexto econômico, político e social que o país atravessa, sob pena de se afastar da sua representatividade popular. Assim, é inaceitável que agentes políticos, no contato diário com a população, sabendo dos altos índices de desemprego, da crise política e social que o país atravessa, vendo lojas e fábricas na cidade fechando suas portas ou reduzindo sua produção, se atentem mais para os seus direitos do que para os seus deveres.

Entre as capacidades que um agente político deve ter é a de se sensibilizar com a população a qual representa e ser modelo de atitude em suas ações do cotidiano. Aumentar o próprio subsídio, mesmo que legal, no momento em que a maioria das pessoas sente no bolso, no estômago e na vida, a situação se deteriorar, é uma prova de que estão indo na contra mão do que afirmam defender na Câmara.

Sabemos que os vereadores com a aprovação do aumento estarão, na verdade, impactando mais os salários da próxima legislatura e que, muitos deles estão confiantes na reeleição. Contudo, se não devemos exigir dos nossos representantes, a sensibilidade (pois esta se tem ou não), podemos cobrar deles a inteligência e afirmar que estão perdendo a oportunidade única de construir em nossa cidade um novo modelo político para o Brasil. Infelizmente, estamos revelando claramente que somos tão somente mais uma célula a diagnosticar as deformidades e distorções que o Brasil tem em seus organismos políticos.

Perdemos mais uma vez a oportunidade de dizer que somos diferentes e isto poderá nos custar muito caro. Menos pelos valores financeiros que acarretarão mais custos ao município e muito mais nos valores morais e éticos que estamos deixando para as próximas gerações. Não mudar o jeito de fazer as coisas é espelho de que “a verdadeira mudança” está longe de ser realidade no município. Pena.

* Wiliam de Oliveira é jornalista, escritor e professor universitário. E-mail: wiliam.oliveira@uol.com.br