Municipalização de escolas gera temores de precarização

Crianças da zona rural se deslocando em alguns casos até por mais de 20 quilômetros para estudar na rede municipal, escolas do Estado fechadas ou com turmas reduzidas e contratos de trabalho desfeitos. Esse foi o cenário vislumbrado por professores de várias regiões do Estado diante do processo de municipalização de escolas estaduais pelo governo de Minas.

O assunto foi discutido nesta quarta-feira (06/11/19) na Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), onde professores vindos de diversos municípios mineiros criticaram o processo, que implica na transferência de alunos do Estado para a rede de ensino mantida pelas prefeituras.

Segundo posicionamento manifestado na audiência pela Secretaria de Estado de Educação (SEE), a municipalização não estaria sendo imposta e sim atenderia a uma demanda das prefeituras.

Professores e representantes de entidades de trabalhadores na educação, contudo, relataram a existência de boatos e ameaças em contrário e foram mencionadas situações em que haveria a municipalização mesmo sem interesse da prefeitura, como no caso de Ubá (Zona da Mata).

Além de dificuldades de deslocamento que a medida causaria aos alunos, o processo de transferência estaria sendo conduzido pela SEE sem transparência, sem estudos técnicos e sem que as comunidades escolares tivessem sido ouvidas.

A professora Lucimar de Lourdes Martins disse que pais e professores temem que a Escola Estadual do Povoado de São Vicente, no município de Simonésia (Zona da Mata), seja afetada pela municipalização mesmo não havendo, segundo ela, o interesse da prefeitura de assumir os alunos do povoado.

Lucimar frisou que a escola atende com educação integral um povoado rural, de famílias de agricultores. “Esse processo (da municipalização) é uma loucura do governo, que nem conhece o território”, criticou, repassando à comissão abaixo-assinado de pais de alunos contra a municipalização, que, segundo ela, exigirá, se implantada na unidade, que alunos caminhem por cerca de 20 km até a escola mais próxima.

Já Judity Serri, representando pais e a comunidade escolar de Nova Era (Região Central), disse que em seu município a Escola Estadual Leon Araújo, que atende 140 alunos, deverá ser fechada e que por conta da municipalização a Escola Estadual Padre Vidigal não está mais aceitando matrículas para o ano que vem.

Já em municípios como Passos (Sul de Minas) estão havendo manifestações de pais contra uma possível transferência de alunos para a rede municipal, segundo relato da professora de Sociologia Maria do Carmo de Oliveira.

Ela dá aulas na Escola Estadual Lourenço Andrade e disse que a municipalização da unidade implicaria na realocação de 406 crianças e na ameaça de desemprego para 50 trabalhadores na educação.

Sindicato vê plano de cima para baixo

Patrícia Pereira, da coordenação em Contagem (Região Metropolitana de Belo Horizonte) do Sindicato dos Trabalhadores na Educação de Minas Gerais (Sind-Ute), ainda denunciou que a Escola Estadual Paulo Freire, instalada na Penitenciária Nelson Hungria, começará 2020 com sete turmas fechadas, o que segundo ela só contribuirá para criminalizar ainda mais os alunos.

Em Araxá (Alto Paranaíba), todas as turmas de 1º ano do ensino fundamental da Escola Estadual Luíza de Oliveira Faria também estariam sendo fechadas, conforme colocado pela coordenadora estadual do sindicato, Denise Romano.

Essas mudanças, segundo Denise, decorreriam do Plano de Atendimento (PA) da SEE, que dimensiona a rede de ensino para o ano seguinte e cuja elaboração teria sido feita à revelia das comunidades escolares afetadas.

“As relações do governo com a escola são baseadas no cumpra-se, de cima para baixo”, disse ela, referindo-se ao PA como “plano de desatendimento”. 

SEE diz que escolas podem sugerir ajustes até dia 11

A subsecretária de Desenvolvimento da Educação Básica da SEE, Geniana Faria, argumentou que o Plano de Atendimento foi disponibilizado este ano em sistema informatizado para maior transparência às escolas e melhor gestão por parte dos diretores.

Ela destacou que o plano é anual e considera a demanda por vagas, os espaços físicos, etapas da educação e a localização geográfica de cada unidade escolar, buscando a qualidade da aprendizagem dos alunos.

Salientou, ainda, que serão garantidas vagas para atender a demanda de todos os estudante. Sobre os questionamentos, disse que os diretores que desejarem modificar o plano da SEE para sua escola podem propor ajustes até a próxima segunda-feira (11) para análise final pela Secretaria.

Sobre a municipalização, Geniana disse que ela será feita nas séries iniciais em 13 escolas estaduais por solicitação dos prefeitos, em municípios como Ribeirão das Neves (RMBH) , Aimorés (Rio Doce) e Ervália (Zona da Mata). Dos casos mencionados na audiência, a municipalização, segundo ela, procederia apenas em Nova Era.

Falta de diálogo – A presidenta da comissão, deputada Beatriz Cerqueira (PT), que pediu a audiência, avaliou que as escolas foram tratadas com desrespeito na divulgação do PA no último dia 25 de outubro, ao citar casos de diretores que descobriram que sua escola não funcionaria no ano que vem ao acessarem o plano no computador.

“Me espantou a ausência de diálogo”, cobrou a deputada, frisando que a comissão acompanhará a revisão do plano conforme acenado pela SEE.

A deputada Celise Laviola (MDB) ressaltou a mobilização e a participação dos professores em torno da educação, tendo o deputado Dalmo Ribeiro (PSDB) lamentado a ameaça de fechamento da Escola Estadual de Bueno Brandão, em Ouro Fino (Sul de Minas).

A deputada Rosângela Reis (Pode) se manifestou contra a municipalização e pediu atenção do Estado para que sejam mantidos em municípios do Vale do Aço parcerias e recursos para a educação.

O deputado Betão (PT), vice-presidente da comissão, considerou que as respostas dadas pela SEE na audiência foram insuficientes.

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