Nostalgia é a muleta que guia Rogue One

O crítico Marcelo Leme comenta sobre o novo capítulo do universo Star Wars

O crítico de cinema Marcelo Leme comenta sobre Rogue One – Uma Aventura Star Wars, um spin off da saga Star Wars.

Imediatamente após a sessão terminar, considerei Rogue One o maior exemplo do que significa ser um caça-níquel no cinema. A pergunta para se chegar até esta consideração foi a seguinte: o filme tem alguma serventia para o universo Star Wars? A resposta não demorou: sim, tem serventia, mas não é tão relevante.

Dito isso, Rogue One não acrescenta nada significativo à série. Oferece algumas respostas e inclui discursos provocadores. Creio que sua existência seja oportunista, mas sua validade não é questionável. É um bom filme com algo a dizer. É bem verdade que a primeira metade arrastada é sofrível, mas tem uma segunda que honra o legado de Star Wars, logo após a aparição de uma figura ilustre que toma toda a atenção e melhora a história e seu ritmo. Tá no trailer!

Se pensarmos Rogue One como algo independente – seu subtítulo diz ‘uma história Star Wars’ -, então esta ganha validade separada da franquia, já que funciona bem como obra insubordinada, todavia, note, os melhores instantes são aqueles que se ligam aos personagens que tão bem conhecemos. A nostalgia é a muleta que guia nosso interesse pela proposta deste novo filme do cineasta Gareth Edwards, diretor de Godzilla (2014).

Nenhum personagem novo é tão interessante o suficiente em seus arcos particulares. Já simbolicamente, são bem pertinentes. Jyn Erso, a protagonista vivida por uma não tão feliz Felicity Jones, raramente empolga. De qualquer forma é bom ver uma protagonista feminina dentro da franquia, similar a Rey em Star Wars: Episódio VII – O Despertar da Força (2015).

Jyn Erso é a nova heroína da saga

Com um roteiro cujo ritmo frustra por ter uma primeira hora pedante e esquemática, lotada de humor frívolo e ação tímida, somos levados a acompanhar a história de Jyn Erso, com o passado e presente da garota, e as implicações de seu percurso no período que divide A Vingança dos Sith e Uma Nova Esperança.

Adentro a essa concepção, acompanharemos um grupo rebelde com planos de roubar os planos da Estrela da Morte, desafiando a hegemonia ascendente do Império e de Darth Vader. A aparição do antológico personagem é um deleite aos fãs. O roteiro sofre para apresentar seus personagens e consolidar Jyn como heroína.

Esse é o desafio de qualquer filme. E este tem dificuldade dobrada por estar sob a sombra de algumas figuras já alicerçadas no imaginário popular desde 1977, com o lançamento do episódio IV. Constantemente somos pegos recordando personagens e onde eles estão (riam). Também é bom perceber algum diferencial narrativo quando este roteiro permite-se se lançar a uma ação que foge do padrão visto sete vezes no cinema, tornando-se um filme essencialmente de guerra, mas ambientado no espaço.

A elaboração dos recintos povoados e das zonas de combate, por exemplo, são vigorosas. Aí funciona divinamente. Funciona por justificar funções particulares e por tentar se distanciar da lógica reconhecida da franquia, visando ser minimamente original, evitando comparações temáticas, apesar de contar com algumas recorrências persistentes, tal como a relação entre pais e filhos.

Parece uma obsessão! Jyn evolui apesar de Jones manter uma imutável expressão e ganhar destaque somente graças aos seus diálogos e frases que ilustram suas motivações, como aquela em que nega olhar para o alto e ver qual bandeira impera. E não é falta de talento da moça, pois ela já provou ter.

É problema de direção! Forest Whitaker e Mads Mikkelsen estão igualmente comprometidos. E o talentoso Diego Luna, que vive o Capitão Cassian Andor, parece a escolha ideal para encarnar um rebelde, personificando uma espécie de imigrante com ideologias políticas desdobradas com orgulho junto a dois asiáticos – entre eles um cego quase místico – e um árabe.

E que hora, em? Trump acabou de ser eleito. Junta-se ao grupo de rebeldes um robô, K-2SO, que é um imigrante entre os outros de sua linha de programação. Por assim dizer, Rogue One é um símbolo da resistência contra a opressão. E dá-se muito bem ao assumir isso.

* Marcelo Leme é psicólogo e crítico de cinema. O e-mail é marceloafleme@gmail.com