Quem tem mais deve pagar mais

O professor Tiago Barbosa Mafra analisa a proposta de revisão da planta genérica do IPTU

O professor Tiago Barbosa Mafra apresenta suas considerações sobre a proposta de revisão da planta genérica do IPTU em Poços de Caldas.

Na tarde de sexta feira, 22, o Executivo Municipal retirou da pauta de discussões da Audiência Pública sobre matérias tributárias o projeto que revisava a planta genérica de valores.

Após pressão popular forte nas semanas precedentes, retrocedeu de última hora, alegando ser momento de ouvir a população. Deveria tê-lo feito na elaboração da proposta. É necessário pensar no cenário nacional, de recessão, de paralisia econômica, estagnação do poder de compra, não favoráveis a de tamanha monta de uma só vez como vinha sendo proposto.

Proporcionalmente, para os mais pobres, uma modificação dessa acarretaria sérias dificuldades financeiras para famílias que vivem apenas com salário mínimo. A média de rendimentos para as famílias poços-caldenses é de 2,4 salários mínimos, sendo que 29% da nossa população vive com rendimentos de meio salário mínimo, segundo o IBGE.

Outro aspecto que remete a outra esfera administrativa, mas que nos afeta diretamente, foi a aprovação da PEC 241/55, que congelou os investimentos primários pelos próximos 20 anos. Esse período será de retração de receitas, num momento em que a população continua a crescer, a renda se achata, a chamada classe média está abandona serviços privados e buscando serviços públicos, pressionando ainda mais a administração dos municípios e a qualidade do que é ofertado.

Vale lembrar que, grande parte dos partidos da base aliada do prefeito municipal de Poços de Caldas, em âmbito federal, aderiu à PEC de congelamento. Como tenho repetido constantemente desde o golpe de 2016, Poços de Caldas não é uma ilha no mundo e sofre os efeitos dessas decisões políticas e das crises forjadas.

Considerando ainda que a planta genérica de valores ficou longo período sem correção, precisamos pesar conjuntamente que há necessidade de garantir os serviços públicos e fortalecer a capacidade de administração e investimentos do poder público (paradoxalmente ao que prega a cartilha neoliberal abraçada pelos tucanos), mas não se pode fazer isso com vistas apenas a um equilíbrio financeiro pautado em um discurso que se pretende livre da política, técnico, como é da preferência da atual gestão.

Assim sendo, algumas possibilidades poderiam ser levantadas para um futuro projeto que trate do IPTU, mas de forma onde os mais ricos paguem mais e os mais pobres não sejam sobrecarregados. Uma adequação gradativa de recomposição da planta de valores seria um bom começo, evitando quaisquer aumentos abusivos.

Além disso, e mais importante, a progressividade em razão do tempo (tempo de uso ou função social) ou valor do imóvel (zoneamento) precisa ser consideradas. Imóveis ou terrenos ociosos, devem ser multados ou taxados acima do padrão, como forma de coibir a especulação imobiliária e a concentração de renda.

Considerar discrepância nos padrões de construção. Se houver um imóvel de edificações modestas numa área considerada nobre, o padrão da construção deverá ser critério de definição de valores a serem pagos.

Outro aspecto poderia se a taxação menor para metragens pequenas, de moradia popular ou programas de habitação, bem como aposentados de baixa renda ou pessoas com doenças crônicas impossibilitadas ao trabalho. Junto a isso, é preciso construir mecanismos municipais de controle de vazios urbanos, como forma de coibir a especulação imobiliária.

A autorização de novos loteamentos apenas seria viabilizada quando as áreas de vazios urbanos estiverem dentro de um percentual estipulado máximo, atrelada à progressão temporal por desuso e descumprimento da função social da terra urbana.

Outro mecanismo possível seria a variação da alíquota de acordo com o zoneamento, para que os mais pobres paguem proporcionalmente menos do que os mais ricos. A constatação nesse momento é que, a proposta apresentada pela administração, da forma acelerada e sem discussão com a sociedade, e retirada às pressas depois da mobilização popular, além de levar em consideração apenas aspectos financeiros, não atende a realidade, a necessidade e os interesses da população.

Espera-se que os legisladores e o Executivo, daqui por diante, tenham essa percepção antes de penalizar os trabalhadores do município sob argumento de estar fazendo justiça tributária. Que em definitivo, a partir de agora, os mais ricos passem a pagar mais. Seria pedir muito?

* Tiago Barbosa Mafra é professor de Geografia da rede pública municipal de ensino e voluntário no pré-vestibular comunitário Educafro. E-mail: tiago.fidel@yahoo.com.br